Há algo de muito especial em ver uma comédia brasileira ocupar o espaço de destaque em um festival. Perrengue Fashion, dirigido por Flávia Lacerda e protagonizado por Ingrid Guimarães, representa esse marco; não apenas por abrir espaço para o humor, mas por mostrar que a comédia também pode provocar reflexão, revisitar afetos e nos confrontar.
Paula Pratta (Guimarães) é uma influenciadora de moda que vive num universo de filtros, campanhas e hashtags. Quando o filho (Filipe Bragança) abandona tudo para se dedicar a um espaço de permacultura na Amazônia, ela se vê obrigada a atravessar a floresta e, com isso, a si mesma. A jornada, que começa como uma busca desesperada pelo filho para participar de uma campanha publicitária fashion, transforma-se numa travessia sobre o que realmente importa.
Flávia Lacerda conduz a narrativa com leveza, sem perder de vista a humanidade dos personagens. Ingrid Guimarães, já reconhecida por sua força cômica, entrega aqui uma atuação madura, divertida, mas também sensível. Há um brilho de vulnerabilidade em Paula: a mulher que precisou ser tudo sozinha, que venceu barreiras sociais, e que agora tenta controlar o futuro do filho como forma de garantir a própria segurança emocional. É nesse controle que mora o drama silencioso da personagem e a comédia surge justamente no atrito entre a fantasia do mundo perfeito e o colapso inevitável da vida real.
O roteiro, assinado por Ingrid, Edu Araújo, Célio Porto e Marcelo Saback, encontra equilíbrio entre humor e crítica. Os diálogos permitem que o riso se converta em afeto. Há momentos genuinamente engraçados, muito pela química entre Ingrid e Rafa Chalub, que forma com ela uma dupla improvável e irresistível. Chalub, vindo das redes sociais, surpreende pela naturalidade.
Mas Perrengue Fashion vai além da comédia de choque cultural. Ele fala sobre as mães solo que carregam o peso de criar sozinhas, sobre a geração que precisa reaprender a escutar os filhos, e sobre o desconforto de sair da zona de conforto, seja ela o feed do Instagram ou o apartamento de classe média.
No fundo, é um filme sobre recomeço. Sobre quando a floresta, literal e simbólica, obriga a gente a tirar os saltos, pisar na terra e lembrar quem éramos antes de tudo virar performance, antes de tudo ser para o outro, quando era por nós.
Ingrid Guimarães prova, mais uma vez, que sabe rir de si mesma e transformar esse riso em algo maior: empatia. Perrengue Fashion faz rir, mas também faz pensar.
Você encontra Perrengue Fashion nos cinemas a partir do dia 9 de Outubro.
Gostou do conteúdo? Então deixa uma comentário para eu saber disso!
Até o próximo texto.