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O Quarto ao Lado – Almodóvar em Novas Terras, Mesma Essência

Pedro Almodóvar, um dos cineastas mais célebres da Espanha, faz sua estreia na língua inglesa com O Quarto ao Lado, recém exibido no Festival do Rio 2024. Essa obra que conquistou o Leão de Ouro no Festival de Veneza, não só celebra a jornada linguística do diretor, mas consolida sua habilidade inigualável de oferecer narrativas emocionalmente ricas e visualmente cativantes.

Inspirado no livro O que Você Está Enfrentando, de Sigrid Nunez, o longa conta a história de Ingrid (interpretado por Julianne Moore), uma escritora consagrada que descobre que sua antiga colega, Martha (vivida por Tilda Swinton), está lutando contra um câncer incurável. Após reencontrar-se com Martha no hospital e perceber sua solidão, Ingrid aceita um inusitado convite para se juntar a ela em uma casa isolada em Woodstock. As duas tentam reencontrar a paz enquanto se deparam com dilemas éticos e emocionais atemporais.

Almodóvar, mesmo filmando em um idioma diferente do seu habitual, mantém sua assinatura. O Quarto ao Lado conserva belos enquadramentos geométricos, cores vibrantes sempre compostas pelo amarelo e vermelho vivos e uma profundidade emocional que são marcas registradas do diretor. O filme usa a beleza visual para contrastar temas pesados como a doença terminal e a perda, oferecendo uma rica experiência visual e psicológica. Entretanto, discutir sobre eutanásia e finitude dentro desses laços não parece ser o maior foco do diretor, que prefere explorar a complexidade e a cumplicidade das relações humanas.

O roteiro, embora não seja revolucionário em termos de inovação narrativa, surpreende ao entrelaçar diálogos cômicos com temas tão densos. Almodóvar demonstra novamente sua habilidade em encontrar leveza e até risos em momentos que poderiam ser esmagadoramente sombrios. Esse toque de humor não só alivia a intensidade do filme, mas também humaniza as personagens, tornando-as mais acessíveis e reais.

“Há muitas formas de viver uma tragédia”.

Tilda Swinton oferece uma performance inigualável. Seu retrato de Martha, tanto fisicamente combalido quanto psicologicamente complexo, é fascinante. Swinton navega entre serenidade e impaciência, ilustrando de maneira crível a oscilação emocional que atravessa aqueles que enfrentam doenças graves e as consequências dos tratamentos, mesmo quando paliativos. Além disso, sua habilidade de inserir um timing cômico em momentos inesperados é uma demonstração de seu talento multifacetado.

Julianne Moore, por sua vez, encara um desafio ainda maior com Ingrid, uma personagem que deve equilibrar empatia e força diante do sofrimento da amiga. Moore encanta e emociona com sua profundidade e vulnerabilidade, oferecendo uma performance que conquista a empatia do espectador.

” Não entendo como algo vivo tem que morrer.”

Eduard Grau, em sua primeira colaboração com Almodóvar, captura a essência visual do diretor, oferecendo uma fotografia que é ao mesmo tempo familiar e revigorante. A trilha sonora, mais uma vez assinada pelo colaborador habitual Alberto Iglesias, complementa a narrativa com uma musicalidade emocionalmente carregada, enriquecendo ainda mais a experiência do público. Há momentos na trilha que o espectador vai se sentir num suspense Hitchcockiano e em outros numa trama Nova Iorquina Woody Alleniana.

O Quarto ao Lado não é apenas o marco de estreia de Pedro Almodóvar no cinema de língua inglesa, mas uma obra que reafirma seu talento inconfundível para explorar o drama humano através de uma lente de compaixão, humor e sensibilidade. A narrativa, embora se mantenha em terreno familiar para o diretor, é intensificada pelas atuações cativantes de Julianne Moore e Tilda Swinton. Almodóvar consegue multiplicar a cumplicidade entre suas personagens sem cair no barato dos discursos edificantes, criando uma experiência que é, ao mesmo tempo, delicada e potente.

Ao redirecionar seu olhar para novas terras, o diretor prova que seu talento transcende idiomas, e que o coração de suas histórias  bate forte através da complexidade de suas personagens, não importa a língua em que sejam contadas. O Quarto ao Lado estreia nos cinemas brasileiros no dia 24 de outubro e será exibido na 48ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo entre os dias 17 e 30 de outubro.

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Até o próximo texto.

 

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Estranha Forma de Vida

“ Há alguns anos você me perguntou o que dois homens poderiam fazer vivendo juntos em um rancho.
Eu te respondo agora.
Eles podem cuidar um do outro, proteger um ao outro, fazer companhia um ao outro.”

 

Os filmes de faroeste ao longo da história do cinema consolidaram uma visão tradicional da masculinidade. Eles frequentemente apresentam heróis fortes, corajosos e heterossexuais, refletindo uma noção estereotipada de virilidade. Essa representação restrita da masculinidade contribui para a heteronormatividade, criando um ambiente onde personagens gays ou bissexuais raramente encontram espaço para existir.

No entanto, a filmografia de Pedro Almodóvar, diretor espanhol conhecido por suas obras inovadoras e provocativas, desafia essas convenções de gênero e sexualidade. Almodóvar frequentemente cria personagens masculinos complexos que exploram uma ampla gama de experiências e orientações sexuais.

Essa abordagem diversificada de Almodóvar contrasta fortemente com a falta de representação de homens gays nos filmes de faroeste, destacando a importância de oferecer narrativas variadas e inclusivas no cinema. Almodóvar demonstra como a arte cinematográfica pode ser uma plataforma para explorar a diversidade da masculinidade e, ao fazê-lo, contribui para uma representação mais completa e autêntica.

Estranha forma de vida, dirigido por Pedro Almodóvar e produzido pelo seu irmão, Augustin debutou esse ano (2023) em Cannes e trouxe atenção para além da heteronormatividade western. Estrelado por Ethan Hawke e Pedro Pascal, o filme que teve seu figurino assinado por Anthony Vaccarello também contou com Saint Laurent como produtor associado.

Com duração de 31 minutos, incorpora o universo da moda ao ter figurinos que dizem que a grife não trabalha apenas com roupas finas como os ternos e camisas que vemos o xerife e o cowboy utilizarem, mas também fazem roupas casuais como jaquetas. Seria um catálogo da própria Saint Laurent ou seria um ato político cinéfilo que diz que o faroeste é para todos? Ou mais que isso; seria uma abertura de caminho para curtas e média metragens serem exibidos no circuito comercial além de em grandes festivais?

Você encontra Estranha Forma de Vida nos cinemas e a partir do dia 20 de Outubro, na Mubi.

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Até o próximo texto.